No café da manhã de hoje, comi uma das bananas-prata que havia comprado ontem e pela segunda vez comprovei o quanto aquelas bananas eram perfeitas.
A marca 2g foi o que me fez escolhê-las logo. Grandes e gordas. Estavam ali para serem compradas, retas, lisas, sem qualquer rugosidade ou imperfeição.
Enquanto descascava a banana do café da manhã, minha cabeça de jornalista deu um clique. De imediato, meu cérebro como que me entregou a leitura de um código de barras invisível. Essas bananas são transgênicas.
Recordei o momento em que dispus as bananas na fruteira. Pesadas, muitas delas soltaram-se da penca, pelo simples manuseio. Ficaram ali, enfileiradas, apresentando ao mundo da minha cozinha branca sua beleza incontestável.
Comi a banana, sentindo seu sabor, entre o doce e o azedo, mastiguei cada pedaço, intimamente ruminando coisas sobre consumidores, cidadania e quetais: Por que os supermercados não nos informam que estamos comprando bananas transgênicas? Por que não sabemos sobre o café transgênico, o tomate perfeito transgênico, a carne transgênica?
Descobri horrorizada que em breve os seres humanos também serão transgênicos. Sim, a transgenia será inoculada em nós por essa cadeia de consumo, plantação/laboratório/supermercados/cozinha-branca/banana/boca.
Ninguém precisará lutar para que seja informado sobre um ser humano transgênico. Não, ele terá marcas identitárias visíveis: O ser humano transgênico cultiva a beleza. Olhe para o seu carrinho de supermercado e você o reconhecerá. Compra as bananas 2g, os tomates mais esféricos e perfeitos, a carne lacrada com selo frree, o café do tipo exportação.
Um ser humano transgênico não gosta desse tipo de discussão ecochata. Ele é decidido. Bate o olho na mercadoria e o seu cérebro lhe entrega o código de barra invisível, emparelhando a conexão do seu desejo com a coisa a ser comprada.
Com quase alívio, constatei, eu ainda não sou transgênica. Gosto da penca de bananas que vem com sua multiplicidade, sua diferença. Bananas convivendo juntas, umas grandes, outras menores, umas corcundas, outras retinhas, mas… com alguma rugosidade na casca. Gosto de bananas que levam tempo para se despegarem do cacho. Gosto de bananas que têm um sabor bem definido, doces!
Não sou transgênica ainda, e, enquanto arrotava, depois do café, pensei que tenho agora mais uma microluta para travar no meu dia a dia. Lutarei contra a transgenia, insidiosa, invisível, inoculando-se naturalmente em nós, por nossas próprias escolhas. Lutarei para ser eu mesma, até o fim, e nunca mais me surpreenderei por essas bananas tão perfeitas, tão incontestavelmente perfeitas.