Por esses dias, estive toda entregue aos processos que sacodem o país, reviram seus valores, amortalham suas crenças. Participei da manifestação do dia 13, convicta do duro sermão crítico que o governo da presidente Dilma Rousseff precisa ouvir, mas ciente de que havemos que juntar nossas forças, a fim de que o pequeno passo dado não venha a ser desviado.
No dia 15, fiquei em casa, mas com toda dor, perplexidade e desalento que o gesto exigiu, mergulhei até o fundo das manifestações, fosse por via das redes sociais, fosse por via da transmissão ininterrupta da Globo News.
O espetáculo era de horror e tinha a natureza da antropofagia. Uma espécie de festim macabro, onde, em sacrifício, pedia-se um partido político, e, na bandeja de prata, Salomé, seios à mostra, exigia a cabeça da presidente.
Em desvario, jovens, crianças, idosos, em trajes de torcida organizada, agitaram bandeiras, desfolharam, aos gritos e gestos largos, a profusão das suas demandas, tão contraditórias entre si, que não caberiam senão numa terra sem lei, um lugar fictício, que por falta de nome, eu poderia batizar de ilha do descalébrio.
O movimento por um Brasil livre, pacífico, segundo toda a cobertura de imprensa, só contou com um incidente grave, um único incidente a atrapalhar a oferta das rosas aos policiais da PM. No meio da multidão, um grupo de “carecas suburbanos”, que quis participar do banquete, foi detido pela polícia, curiosamente, sem oferecer qualquer reação de protesto ou de defesa.
Dez horas monumentais de desvario, e um recado claro. Há um fosso profundo entre o discurso e a ação política, um pavoroso divórcio litigioso que suprimiu a ética, a sobriedade e a sensatez, em favor do triunfo da ignorância, do egoísmo, do desrespeito flagrante ao estado institucional da legalidade e suas autoridades.
Há mais, porém. Um inquietante vazio, onde deveria haver os líderes, o conjunto de princípios, a força inquebrantável de uma verdade compartilhada, a qual pudesse de fato permitir um avanço real, rumo a um país livre.
Não nos enganemos, nós também temos parte nesse festim. Nós também ajudamos, em alguma medida, a fundar essa terrível ilha do descalébrio. Nossas omissões, nossos silêncios, nossas horas de ócio em nossas zonas de conforto, o zelo por nossas corporações, tanta coisa mais, foi cavando esse fosso, criando esse vazio, abrindo de par em par as comportas dessa orgia.
Sei que há muitos sorrisos cínicos a circular, muito esfregar de mãos, muitas teses apressadas, com a chancela da imprensa oficial, acerca do “fim do Brasil”. eu estou desolada e perplexa, com o tamanho dessa ilha e do seu descalabro.
É isso ai Joaninha, bela crônica
Adorei companheira Joana belarmino, sei de toda sua angústia sobre os acntecidos recentes. Assino em baixo.