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Falta de Notícia Ou Falta de Vergonha?

Sempre soubemos que o jornalismo da rede Globo, seja por imposição da empresa, seja por vocação dos profissionais, está plenamente sintonizado com os interesses do capital especulativo e neoliberal. Na atual conjuntura, âncoras de tv vêm travando uma verdadeira queda de braço com declarações do presidente Lula, que por sua vez, vem fazendo duras críticas a temas como a independência do Banco Central e as altas taxas de juros impostas ao país.

O presidente, cada vez que pode, traz à baila os dois temas. Os jornalistas, imediatamente, com suas tesouras  de recortar os acontecimentos, passam a explorar essas falas, dentro daquela moldura do bem e do mal, sob a máxima: O mercado está certo e o presidente não ajuda, com suas falas.

Os comentários não têm qualquer substância, nenhum aprofundamento. Apenas ratificam os interesses da mídia e pavimentam o velho terreno da crítica ao governo de esquerda eleito.

Mas cabe uma pergunta: Por que o presidente Lula tem falado tanto sobre esses dois temas? Creio que com essa insistência, Lula passa um recado importante à rede Globo: Lula insiste para dizer que como presidente da república, terá liberdade de pensamento e de opinião. Mais que isso: não deixará de enfrentar os duros temas que assombram o país e que impedem o crescimento da sua economia.

Mas essa guerra de discursos tem um propósito mais relevante: Lula diz ao país que um governo social democrata vai sim enfrentar o tema das taxas de juros e vai balizar até onde pode ir a independência do Banco Central. Um governo social democrata vai governar sobretudo para os mais pobres, os mais vulneráveis, chamando para esta missão, o empresariado, o parlamento, o “mercado” brasileiro especulativo, poucos milionários situados na Faria Lima, que combinam o sobe e desce das bolsas, com ameaças e recados que a mídia não apenas divulga como defende religiosamente.

Falta de notícia ou falta de vergonha? A mídia, e mais particularmente a rede Globo, tema desse post, ao longo da sua trajetória de mais de 50 anos, vem traçando sua linha de defesa do mercado, do jornalismo dedicado à voz das autoridades, divorciando-se irremediavelmente dos interesses da sociedade, dá defesa dos mais pobres e mais vulneráveis. Essa linha reta, gerando uma pauta monotemática de crítica aos governos de esquerda, já engendrou, somente para falarmos de episódios recentes, o golpe 2013/2016, e, o nefasto período Bolsonaro, que empurrou o país para a barbárie, o terrorismo e a colocação do Brasil , de novo, no mapa da fome.

Não se trata, pois, de falta de notícia. Trata-se sim, do enquadramento em uma notícia única, num esforço para recolocar o país nos trilhos do mercado e do neoliberalismo, no desejo invocado todos os dias, por uma terceira via, capaz de harmonizar-se com o diapasão midiático: política de juros altos, independência do BC, e tantos outros projetos defendidos por esta agenda infame. 

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Até Quando A Imprensa vai Editar Bolsonaro?

Nós que elegemos o presidente Lula, estamos divididos por dois sentimentos antagônicos: Um sentimento de celebração e de vitória, outro de preocupação e vergonha. É como se vivêssemos em duas realidades. Numa em que sorrimos e sonhamos com o futuro bom que se avizinha, outra em que há poluição, paralisia e ódio sendo destilado. Mas o que mais me inquieta é assistir à imprensa televisiva agarrada ao discurso mal_ dito do presidente Bolsonaro, tentando editar suas melhores partes, tentando encontrar naquela ffala canhestra de dois minutos, frases que ele não disse, intenções que ele não teve, reconhecimentos que ele não fez. Vendo esse comportamento midiático, reconheço que ao longo desses quatro anos, a imprensa sempre esteve agarrada à uma linha editorial de minimização dos danos e dos ditos nefastos do presidente Bolsonaro. Não, mídia brasileira. Bolsonaro, o derrotado, apresentou-se ao seu séquito como herói; destilou seu discurso de ódio, prosseguiu na sua narrativa do nós contra eles. Deixará o planalto pporque é de lei, porque o estado brasileiro assim determina. Indago se fossem Dilma ou Lula, a fazerem essa fala ao país. O que a mídia estaria dizendo?

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A Tragédia como Notícia e a Desfiguração da ?Realidade

Enquanto faço leituras de preparação das minhas aulas da semana, repercute em mim, a tragédia que tomou conta do noticiário televisivo paraibano: O suposto assassinato de uma criança de 1 ano e três meses, provavelmente pela mãe, através de mais um cruel episódio de violência doméstica.

Tento refletir sobre o caso, e mais particularmente sobre a sua cobertura, no âmago mesmo da profissão jornalística. A formação dos profissionais de jornalismo esteve e ainda vive atravessada por dicotomias importantes: Teoria versus prática; formação universitária versus dom e vocação; jornalismo informativo versus jornalismo sensacionalista; notícia informativa versus sensacionalismo são algumas dessas dicotomias presentes na história da profissão.

Na atualidade, é certo que há um predomínio do jornalismo informativo e de serviços, e, ao lado deste, um gosto pelo sensacionalismo em muitos veículos de mídia. Mas o que isso tem a ver com o acontecimento trágico da semana? O jornalismo errou na sua cobertura?

Do ponto de vista da atual tendência para uma cobertura informativa dos fatos, o jornalismo certamente fez o que estava determinado fazer. Trouxe o ocorrido com seu lead, ouviu autoridades, escutou as vozes da comunidade, apresentou o quadro fornecido pelos médicos sobre a morte da criança. Deu visibilidade a um fenômeno sinistro, muitas vezes perpetrado dentro das casas, sem que se tome conhecimento do terrível desfalque que se faz à infância, ao direito de viver, com dignidade, acesso aos bens e serviços, e, mais que tudo, acesso ao amor e à proteção familiar.

Ao escutar a cobertura, entretanto, percebi que algo estava a escapar-se irremediavelmente das notícias. Pensei que a imagem daquela mãe era como que desfigurada por uma sombra. Na tevê, tudo estava certo. A técnica, a passagem para o repórter, os depoimentos, o breve suspiro dos âncoras dos telejornais. As atualizações davam conta do enclausuramento da mãe, no cemitério, a cobertura dava visibilidade à revolta dos moradores da comunidade. Por que então persistia em mim essa zona de sombra?

Segundo o que penso, a sombra, a falta irremediável   está no jornalismo informativo como tal. O jornalismo informativo, essa fábrica de moer os acontecimentos, e de extrair dos mesmos, a sua face mais objetiva, mais superficial, aquela face particular que possa entesourar o fato na coleção dos outros fatos, da violência doméstica, do tráfico de drogas nas periferias, das ocorrências policiais de toda ordem. O que se escapa ao jornalismo informativo, é o profundo mal-estar que envolve as relações sociais, e que se perpetua ad infinitum, na história da sociedade, nos seus processos de distribuição das riquezas, na ausência do estado em políticas de acesso à educação, à saúde, proteção à infância, em periferias que distam de nós em míseras meias horas, se tanto, mas acham-se encobertas por uma zona profunda de outros distanciamentos.

Fosse o jornalismo informativo revolver na moenda do noticiário, os restos desprezados desses acontecimentos, encontraria ali matéria sombria, repleta de séculos e séculos de ausências inarticuladas, naturalizadas, cheia das sílabas ininteligíveis do desespero, que não cabem na moldura do lead, nas suas seis perguntas objetivas e previsíveis.

O enclausuramento da mãe é o ponto final da notícia, para o jornalismo informativo. Não se falará do abandono paterno, nada se dirá dessa mulher terrível, na sua vestimenta de presidiária, ocultando no corpo e na alma, todo um solo feito das misérias   que foram tecendo, vestindo e cimentando o seu ser de agora, esse ser que não pôde proteger da morte a criança pequena.

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Entre Pitaias e um Telescópio: Duas Excelentes Pautas no #JPB1

O JPb1 dessa sexta-feira, 3 de setembro, trouxe duas pautas excelentes. A primeira tratou da participação daParaíba na ida do homem à lua, através de um telescópio construído por Afonso Pereira, e que fazia parte do acervo tecnológico da Associação Paraibana de Astronomia.

O laboratório, de grande alcance para o espectro observacional da nossa galáxia, e mais particularmente para coletar informações sobre nosso satélite, está hoje abandonado, num prédio também em ruínas, no centro da cidade, Rua 13 de Maio.

A reportagem, ainda que não o diga, deixa para nossa interpretação, pelo menos duas constatações: A Paraíba tem uma história bonita, para além da história oficial conhecida, que lamentavelmente não está sendo preservada, nem monetizada, parao fortalecimento do turismo, da economia criativa e de projetos em educação e cultura.

A segunda constatação diz respeito ao jornalismo científico, artigo tão escasso dentro da produção de conteúdos de reportagens em nossos veículos de comunicação.

Da minha parte, vou mobilizar meus alunos para recuperarmos a história desse observatório e seus personagens, através de reportagens científicas sobre o tema.

A segunda pauta foi sobre o cultivo da Pitaia no município de São Mamede. Fiquei deliciada. A Paraíba, rica em cactos, está aprendendo a cultivar e consumir a frutinha de cor exótica. A Paraíba é rica, só precisa melhorar as maneiras de descobrir e explorar suas fortunas, que estão amealhadas sobretudo naquilo que o estado guarda em originalidade, singularidade e regionalidade.

E aqui vai um selo de qualidade para os que fazem o JPb1, e o desejo de que boas novas pautas continuem sendo planejadas.

A Consciência do Jornalismo seria a mesma coisa que Fatura Paga?

Perdoem-me esse título que não é título, senão um desabafo indignado e desajeitado. Pois vamos aos fatos. Nesta segunda-feira à tarde, enquanto preparava minhas aulas da semana, a tv ligada ao fundo, para não perder os acontecimentos jornalísticos do dia, indignei-me com a exibição de uma propaganda no canal à cabo Globo News.

                Era uma propaganda do governo federal, sobre medidas de proteção da Amazônia, com um desfecho que dizia: “Infrator da lei, aguarde, nós vamos te pegar”!

                A minha primeira reação foi de espanto. Como assim? Por que a Globo News exibe esse tipo de propaganda? Eu me explico. A Globo News, na minha opinião, está entre os canais de comunicação que mais trabalharam pela candidatura de Bolsonaro. À época, a campanha feita pelas mídias comerciais era contra a candidatura de Fernando Hada de, naquele estilo de cobertura      espetacular, em que se revisitou a fórmula do bem e do mal, sendo Bolsonaro, acreditem, vestido pela mídia como o bem, representante do liberalismo, das políticas de arrocho e pró mercado, capaz de acabar com a “pecaminosa corrupção dos governos petistas”.

                A mídia já havia colaborado decisivamente para a derrubada da presidente Dilma, já se constituíra no braço central da operação Lava Jato, e agora empreendia o último passo da jornada rumo ao Brasil da “nova política”.

                Essa lua de mel entre jornalismo e presidência durou pouco. A mídia, em alguns meses, lançou-se à uma cruzada crítica contra o bolsonarismo, num estilo que nos fez de novo sentir esperanças de que finalmente as comunicações tinham feito um pacto com a sociedade, com a defesa intransigente da democracia, da justiça, da  distribuição de renda, com  denúncia incisiva dos desmandos de um desgoverno feito por uma extrema direita rançosa e retrógada.

                Sim, com quase o mesmo vigor da era Dilma, a Globo News combate o bolsonarismo em todas as suas vertentes: desmandos no meio ambiente, descasos na saúde, crime no combate à pandemia do covid 19, escândalos de corrupção da família, discurso de ódio, enfim, em todos os dias, e em todos os programas, o combate é sistemático e vigoroso.

                Então por que exibe a Globo News, uma propaganda mentirosa, um exemplar formidável dos fake News que o governo Bolsonaro produz?

                Como podem conviver numa mesma emissora, num mesmo programa e horário, discursos tão antagônicos? Por que os jornalistas não assumem uma posição contra esse tipo de fake News que desmente em cores e imagens, todo o discurso de combate a um governo com uma lista tão longa de desmandos e crimes contra a sociedade, o meio ambiente, o clima do planeta?

                Como jornalistas podem dormir com a consciência tranquila, sabendo que seus salários são pagos com a exortação da mentira, do crime e do desgoverno?

                Chamem-me de ingênua, mas não me conformo com esse combate conveniente. À época da ditadura, jornalistas corajosos que protestavam contra a exceção e a censura, publicavam páginas em branco ou receitas de bolo, numa voz eloquente de indignação. Por que então os jornalistas de agora não protestam? Por que não se insubordinam com os setores comerciais de suas empresas, quando estes embalam mentiras e distribuem em horário nobre, depois da fatura paga?

O Jornalismo da #VazaJato e as suas Lições

Havia um nítido clima de tensão na última edição do programa Roda Viva, levada ao ar pela Tv Cultura, na segunda-feira, 2 de setembro. Com raras exceções, as vozes dos jornalistas tinham tons alterados, as inquirições, de todos eles, eram de ataque, da busca por uma falha, um deslize   que fosse nas respostas firmes, rápidas e elucidativas do jornalista Gleen Greenwald, entrevistado da vez.

Para uma plateia de centenas de milhares de telespectadores, audiência barulhenta que participava do programa pelas redes sociais, o que ficou patente naquela entrevista, foi, de um lado,  a revelação clara da arquitetura do jornalismo brasileiro comercial, e, do outro, um modo de fazer jornalismo calcado no ideário clássico da profissão, cujas lições são as da investigação dos fatos até as últimas consequências; a preservação dos   seus preceitos éticos, a defesa intransigente da pluralidade, da imparcialidade e do sigilo das fontes.

Mais do que tensão, a meia dúzia dos jornalistas presentes na bancada experimentava medo e revolta. Medo por se verem expostos a uma implacável máquina demolidora dos ataques, das tentativas da prática jornalística do premiado Gleen Greenwald, revolta por sentirem estar sendo desmantelada de maneira célere, a fabulosa história sobre a Lava Jato e as suas conquistas, divulgada, alimentada, acarinhada  e cultivada com esmero pela mídia brasileira durante os últimos cinco anos.

Para compreendermos a situação de indigência vivida pelo jornalismo brasileiro, que está vendo ir pelo ralo, um dos acontecimentos jornalísticos mais bem construídos dos últimos tempos, há que se retornar às duas últimas décadas do século XX, quando a mídia do país alcançou um formidável progresso técnico, ingressando de vez no paradigma tecnológico. Transformaram-se completamente as rotinas do fazer jornalístico. O progresso técnico, porém, imprimiu à prática dos profissionais, uma produção voltada ao sensacionalismo, à informação de consumo ligeiro, a primazia de um jornalismo declaratório, esvaído de todos os seus processos qualitativos: apuração, investigação, pluralidade e imparcialidade das coberturas.

Os altos custos do progresso técnico da mídia, exigiram também, dos seus proprietários, uma proximidade cada vez mais nítida entre a construção de uma opinião de consenso sintonizada com os interesses do capital nacional e norte-americano, forjando uma leva de jornalistas fazendo coberturas homogêneas, publicando releases e dando voz a declarações sem um naco qualquer de apuração, repercussão, interpretação.

A Lava Jato e os seus heróis, não teria vivido sua era de ouro, não fosse a cumplicidade, quase conversão da mídia brasileira. Mas eis que o jornalista Gleen Greenwald saca da sua premiada ousadia e coragem, desce aos porões da Força Tarefa, e de lá exuma uma realidade obscura, tecida por corrupção, clientelismos, parcialidade e aferição criminosa de lucros.

O Roda Viva da última segunda-feira foi uma tentativa vã dos jornalistas, para desqualificar o trabalho que eles próprios não quiseram fazer. Foi um esforço medíocre e vergonhoso para salvar seus heróis e a gigantesca fábula da Lava Jato. Foi um apelo barulhento para tentar ocultar as falhas de um jornalismo realizado impunemente a serviço da criminalização, da difamação de pessoas, do cultivo do ódio e da interferência criminosa nos destinos da política do país. Foi um débil grito para tentar calar os resultados nefastos da sua cobertura: O hediondo país governado por Jair Bolsonaro.

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(Este post foi publicado hoje, em minha coluna impressa do Jornal A União)

A Aula de Jornalismo de Bolsonaro

 

Na sala de aula, há professores que falam manso. Há outros que gritam. Há os que se entusiasmam. Eu sou desse grupo. Já o professor Bolsonaro é daqueles que fica furioso. Ameaça a classe, que fica silenciosa, espocando seus flashes, mas, completamente calada.

A aula de jornalismo de Bolsonaro foi no melhor estilo. Transformou o que seria uma entrevista numa live crivada de impropérios. Fez a recomendação que está nos livros clássicos do Jornalismo. “Dizer a verdade”. Recomendou a Bíblia como livro principal do seu tópico, e, indicou o versículo a ser seguido.

Os jornalistas calados e ele desfiando: As palestras de Merval Pereira pagas com dinheiro público; os outros palestrantes da Globo. Cristiana Lobo, Juliana Morroni, entre outros denunciados.

Fez ameaças. Ou dizem a verdade sobre o governo, ou param de bater no presidente, ou posso mandar vocês embora daqui. E prometeu mais. Como um verdadeiro revolucionário, disse que vai distribuir equitativamente a renda publicitária para todos os veículos. Vai acabar com essa história da Globo abocanhar setenta por cento das verbas.

Bolsonaro, amparado sobre o discurso da verdade, mentiu descaradamente. A rede Globo ajudou na sua campanha presidencial. A Globo elegeu Bolsonaro. A Globo, mesmo agora, quando o país se transformou numa pocilga, a Globo patina entre a louvação ao presidente e as críticas tímidas.

A aula de jornalismo de Bolsonaro explicou com palavras furibundas, que dizer a verdade é falar bem do presidente, do seu governo, dos seus ministros. Dizer a verdade é levar às últimas consequências, a máxima “se achar melhor a gente edita”, que a rede Globo soube praticar tão bem ao longo da sua trajetória.

Mentiu descaradamente, porque tem entornado dinheiro público nas burras de Sílvio Santos e da Rede Record. Tem mexido os pauzinhos, e uma a uma, vão caindo cabeças dos bons jornalistas que ainda há no Brasil.

Em nenhum momento da sua aula virulenta, Bolsonaro pronunciou a palavra censura. Não precisava. Ela estava lá, como uma impinge maldita, como chamas ardentes, incinerando a democracia.

Quando a Notícia Atropela o Jornalismo

                Em tempos de jornalismo mínimo, factual, declaratório, enquadrado sob um único ângulo, feito geralmente sob a velha rubrica do lead insosso do “quem, diz o que, a quem, com que efeito”, as vezes esse tipo de jornalismo é impactado por um “cisne negro”, um iceberg, um tsunami.

                Foi o que ocorreu no início desta semana, quando o site The intercept br divulgou reportagens com farto material sobre a operação Lava Jato e suas nada corretas relações. O escândalo repercute em toda a sociedade, reverbera estrondosamente nas redes sociais, e, colocou em operação de guerra, a equipe de profissionais da rede Globo, muitos deles, os mesmos que trabalharam com o insólito episódio conhecido como “bolinha de papel”, envolvendo o candidato José Serra, na campanha eleitoral de 2010.

                O mecanismo é o de sempre. Se você tem um escândalo muito grande, que ameaça inclusive os negócios da Globo, invente logo uma boa cortina de fumaça. Grite. Esperneie. Chame os âncoras para ensaiar as performances.

                A cortina de fumaça da vez envolve a invenção de um hacker poderoso, que invadiu os celulares de procuradores do MPF, de membros da força tarefa da Lava Jato, e de jornalistas da Globo.

                Enquanto as redes sociais repercutem até à exaustão, as promíscuas relações entre o então juiz Moro, com o MPF, ministros do Supremo e até agentes americanos, o Jornal Nacional esmera-se em noticiar as ações do  , encenar seus diálogos, revelar sua disposição em se apresentar.

                Com seu mecanismo de falsear a realidade, inventar barrigas,enquadrar a realidade de acordo com os seus interesses,  a rede Globo vai aprofundando o fosso entre o seu jornalismo e os interesses da sociedade. Vocifera contra os vaz                     amentos que agora colocam a Lava Jato em cheque, quando ela própria beneficiou-se largamente dos vazamentos praticados pelo então juiz Moro, nas suas ações persecutórias contra o ex-presidente Lula. Os crimes de Moro eram apregoados e louvados pelos âncoras da Globo, que agora transpiram ódio pelo estupendo e corrosivo material que o The Intercept vem divulgando desde o domingo nove de junho.

                A verdade é que nesses cinco anos de Lava Jato, Moro, Deltan

dallagnol, agentes da polícia federal e rede Globo, constituíram uma força-tarefa poderosa, operando com a narrativa do ex-presidente Lula como chefe da maior quadrilha corruptora do país. As ações céleres do juiz, no caso Lula, retiraram o ex-presidente da corrida eleitoral, e, encarcerado em Curitiba, foi impedido de falar, e assim a candidatura petista perdeu as eleições de 2018 para o candidato Jair Bolsonaro.

                A façanha de Moro e sua equipe, rendeu-lhe o superministério da justiça, mas, agora vem à tona o cheiro fétido dos porões onde tudo isso foi urdido.

                Nas instâncias do “Morogate”, o poderoso hacker inventado pelo mecanismo da Globo nunca teve tanto espaço de tv. Já o The Intercept trabalha duro para entregar material jornalístico de qualidade, em torno das mais de mil horas de informação que segundo informou, uma fonte anônima entregou ao site.   Não se sabe quem vencerá essa batalha. Se a república de Moro, ou o jornalismo ativista de Glenn Greenhald. A sociedade, esta sim, vê desmoronar a democracia, a ética na justiça e a promessa de que o jornalismo oficial faça seu trabalho de acordo com o que promete nos seus manuais.

Nota 1. Este post foi publicado em minha coluna impressa do jornal #AUniao,na última sexta-feira.

Nota 2. a #Globo começa a #desmoronar a barriga do #Hacker!

Nota 3. As próximas  explosões podem implodir a cobertura dos #Marinho!

Fabrício Queiroz: Um Cidadão de Bem

 

(Este post foi publicado na última sexta-feira, em minha coluna impressa do Jornal A União)

 

Assisti a íntegra da entrevista de Fabrício Queiroz à jornalista Débora Bergamasco no SBT. O ambiente era protegido. Não houve perguntas incômodas, ao contrário, havia o intuito de que ele se explicasse, pudesse contar a sua história plausível, e assim viesse a aplacar o enorme ruído em torno das suas operações financeiras descobertas pelo COAF.

Ao longo da entrevista, Queiroz foi desenhando em largos traços o seu perfil. Pai, marido, cumpridor dos seus deveres. Trabalhador contumaz, deu sangue e suor para a campanha ao senado do seu empregador, Flávio Bolsonaro. Alcançada a vitória, era hora de pensar em si mesmo.

Com um sorriso no rosto, Queiroz revelou os flagelos que enfrenta. Uma bursite no ombro, um pouco de sangue nas fezes, e, no dia mesmo em que deveria atender à quarta intimação do Ministério Público, a notícia de que tem um câncer no intestino, um tumor grande que precisa ser extirpado.

Não, Fabrício não usou essa palavra extirpado. Ele até se atrapalhou na hora em que revelou que havia feito uma biópsia. Queiroz fala de maneira simples, abusa dos rs, insiste no vício de que ele é o “pobrema”, na tentativa de afastar a família Bolsonaro das investigações do Coaf e do barulho da imprensa.

“Um cidadão de bem”, “um sujeito bacana”, “querido, muito querido”, e para provar, declara à jornalista que recebeu mensagens solidárias de dez, doze parlamentares da Alerj.

O tempo todo Fabrício usou uma tática que parece lhe ser habitual: Fabrício revelou coisas e omitiu outras, sempre com o mesmo sorriso e a certeza de que estava num lugar protegido. Com naturalidade, disse que só falaria sobre as movimentações da sua conta bancária no Ministério Público. Escondeu o sobrenome do seu médico, assim como o hospital onde esteve internado para exames invasivos.

Deu detalhes muitos sobre a sua doença. Falou do estado das suas fezes, riu ao descrever o exame de toque, o primeiro que fez na vida, segundo declarou. Até aproveitou para mandar um recado às filhas: “Papai tá bem, papai vai ser operado, mas tá bem”.

Uma história plausível? Eu diria que há na sua narrativa, um esforço canhestro de edição. Um jeito mal arrumado de dizer as coisas, colocando fatos díspares em cima de fatos díspares. Engenharia doméstica para forjar a sua casca de cidadão de bem, homem trabalhador, um sujeito que sabe “fazer dinheiro”.

A narrativa de Queiroz oscila entre uma esperança e o risco completo. Esperança em que o jornalismo declaratório e factual empacote sua história como verídica. Esperança de que o MP estadual, aliado ao Ministério da Justiça, endosse e dê plausibilidade ao seu discurso.

O risco vem do lado da possibilidade de um jornalismo investigativo prosseguir escavando as lacunas da sua história. Um jornalismo investigativo que queira insistir em perguntas incômodas, provas e contraprovas, um jornalismo ocupado em perseguir os rastros do dinheiro do Queiroz, isto sim, poderá ser um grande risco para a ruína da sua narrativa.

 

Mais do Mesmo na Velha Mídia

Reproduzo aqui, minha coluna de agosto de 2013, escrita na época da chegada dos profissionais do “Mais Médicos”.

 

Estão chegando. Da Espanha, de Cuba. Falam a mesma língua, mas, curiosamente, cada um tem um discurso territorializado. A médica cubana, no aeroporto do Recife, diante dos microfones da Globo, disse que vinha para colaborar com o povo brasileiro. A médica espanhola disse que estava vindo “com medo do desconhecido”.

O que impressiona, nesta cobertura do programa “Mais Médicos” feita pela velha mídia, é o desarrolhar da antiga maquinaria discursiva da época da guerra fria, é o revalorizar da polarização entre capitalismo e comunismo, num tempo em que as polaridades estão cada vez mais diluídas dentro de um projeto de mercadorização da vida do mundo, em todas as suas esferas.

Mais médicos, mas o problema do nosso mundo não se resolverá. Levas e levas de médicos, mas a doença principal que acomete o mundo ficará intocada. Um mundo que foi alicerçado em cima de fraturas. Na era dos cruzados, eram os cristãos e os bárbaros. No período moderno, o estado, os cidadãos livres, a massa operária e aqueles que só tinham de seu a miséria.

Os dias de agora são os de valorização do Deus capital, alimentando-se de si mesmo, nos paraísos da liberdade fiscal. As fronteiras abissais, como bem nos diz Boaventura de Sousa santos persistem. O seleto grupo dos afortunados, as classes médias, ora ganhando, ora perdendo nacos de status; a horda dos pobres, com seus diversos graus de carecimentos.

A velha mídia, aferrada às velhas engrenagens da política, feito um cão subserviente e fiel, repete a narrativa da batalha entre comunismo e capitalismo. O “mais Médicos” veio para ajudar ao comunismo dos Castro. Veio para escravizar trabalhadores, rosnam seus microfones e as suas manchetes impressas.

Quase nada se diz sobre o mundo real. Tampouco se toca no mundo dos afortunados, essa casta privilegiada que usufrui livremente dos bens, dos serviços e da riqueza produzida por todos.

Nada se fala sobre a condição humana, recebida por cada habitante da espécie mamífero/falante/pensante que chega ao planeta terra,  condição que foi se degradando por entre os desvãos dessa organização abissal do mundo.

 

Venham todos os médicos, trave-se a batalha entre os médicos brasileiros e os médicos do resto do mundo. A doença da desumanidade, a doença da mercadorização da vida, a doença da fome do capital, estas, não tem médico que cure.

A velha mídia, por sua vez, nada dirá que não seja a repetição do velho discurso da política, maquiagem para esconder as reais fraturas do mundo vivo, ocupado em engendrar suas magníficas ou cruéis maneiras de se ser humano.