Neno, Nena e muito mais

Amanhece em Bitinguí e os pássaros daqui têm uma alegria desmedida. O mar, orlado pelo coqueiral, inventa sua eternidade, ondas a se desmancharem, brincando de enrugar e alisar a terra.

Abro a portada da varanda e não há notícias do frenesi  de cidade grande, apenas o povoado acordando para o sol, para a pesca, a faina de cada um, simplesmente amanhecem em Bitinguí e sei que o dia seguirá seu curso, sem pressa.

Se eu pudesse me dar o tempo de aprender sobre esse pedaço de mar quase esquecido, protegido pelo renque dos coqueiros, seu eu pudesse me dar os dias de caminhar por essa pequena faixa de terra, para decifrar suas rugosidades, seus aplainamentos, suas folhas secas, eu ficava aqui.

Ficava aqui para assistir ao dia começado de Neno e Nena, tocando a pousada Lua Cheia. Ela, pequena, falar suave, as palavras tecidas com uma antiguidade menineira guardada numa mulher cujas mãos estão sempre a tecer e destecer o manto do cuidado, do arranjo, da gentileza  e generosidade.

Neno, econômico no falar, seu mundo construído por ele mesmo, determinação e simplicidade sendo a argamassa melhor da sua obra.

Foi Nena que chamou a pousada de Lua Cheia. E a cada quarto deu um nome ligado à lua. Estou no Lua Nascente, bem ao pé do dia amanhecido, ao final do corredor.

Fico assistindo aos retalhos da manhã. A alegria dos bentevis, um grilo esquecido de que já é dia, a martelar o concerto das aves. Não sei se é Neno ou Nena que varre sem pressa as folhas de ontem.

Não, queridos leitores, essa não é uma invenção da minha escrita, tão pobre ela é para traçar as margens, a simplicidade e a beleza de Bitinguí.

Bitinguí, Neno, Nena, o mar todo entregue somente para quem chegar, isso tudo existe de verdade, em Japaratinga, alagoas.

Você chega e Nena lhe entrega a chave do quarto. Lua Nova, Lua Minguante, Lua nascente… Nena lhe entrega a pousada Lua Cheia, esse pequeno edifício plantado na linha dos coqueiros, e de presente, Nena lhe aponta a praia, indica o caminho por onde ir, desviando você dos buracos, sem falar nada, que palavras aqui não são necessárias, Nena lhe entrega o mar, e ele é todo seu, quase como um amigo íntimo, a quem você não precisa contar nada, mas apenas deixar-se lavar por essa água morna de fim de dia.

Não tenho nenhuma fotografia, somente as mãos e a alma imundas de encantamento, por Bitinguí, sua paz, suas horas cheias de vento e silêncio, a alegria dos bentevis, seu cheiro de mar e de mato, a faina de Neno e Nena,  a cuidarem desse lugar de conto de fada, encravado nesse pequeno recanto de mundo. Esse lugar existe e nos ensina sobre outro ritmo, outro modo de caminhar, sem pressa, parando aqui e ali, para escutar o dia, os pássaros, o silêncio, tingido da música do mar.