Pensar no tempo a se estender, segundo a segundo, o tempo dos relógios, dos calendários, dos satélites; pensar no tempo universal, esse grande tapete elástico, e nós, a caminharmos sobre ele, a vivermos cada um a ação do seu tempo, isso me fascina, me faz reflexiva.
Segundo a segundo, a mais de um ano, me preparei para viver o dia de hoje. Um dia que começa como os outros, com seus pássaros, minha nesga de sol, as casas que acordam, o barulho dos cães, o mar, lá no fundo a espremer suas ondas.
E eu a espremer inutilmente essa minha escrita, incapaz de transpor a minha emoção para esse post, lugar de diálogo entre mim e os meus leitores queridos.
Pois vou dizer de novo o que já disse, tantas vezes, como se não acreditasse, vou-me embora pra Paris, vou ver a casa onde, no dia 4 de janeiro de 1809, nasceu um menino franzino que viveu a saga do seu tempo para fazer luz e abrir as portas da cultura letrada a milhões de pessoas em todo o mundo.
Vou à escola onde ele estudou, onde num dia qualquer da sua curta vida, forjou a malha em relevo por onde transitam mãos de mulheres e homens cegos, num gesto único de tocar as palavras.
Vou caminhar pelas ruas, apossar-me do cheiro e dos ruídos da cidade luz, abocanhar suas ilhas de silêncio, e pensar, pensar, no poder que essa escrita pontográfica nos deu, poder que muitos ignoram, poder que outros desprezam, poder que nos alastra o espírito, poder que nos permite, quase que acariciar, com o sobrevôo dos nossos dedos, a beleza da poesia, a vida subterrânea da literatura, o progresso da ciência.
Vou visitar o Panteon, e quem sabe forje com a minha escrita braille, uma carta para Luís, uma espécie de prece, ou de poesia, não sei. Sobre o tapete do tempo, os pés plantados no solo do Panteon, que palavras me advirão, trêmulas e inúteis, a tentarem articular a narrativa desse momento mágico, lugar entre dois tempos, e a vaga dos acontecimentos de dois séculos passados?